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Pesquisa destaca papel de psicólogas na notificação de casos de violência sexual

Publicado em 23/08/2022

Estudo analisa perfis profissionais, crenças sobre violência sexual e tomada de decisão para notificação

A violência sexual é uma triste realidade que assombra o Brasil, principalmente contra crianças e adolescentes. Dados apresentados pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), mostraram que entre os anos de 2017 e 2020, foram registrados no país mais de 180 mil casos de violência sexual com vítimas de até 19 anos, uma média de 45 mil casos por ano. Dos envolvidos, crianças de até 10 anos representam 62 mil das vítimas.

Nesse contexto, casos de suspeita ou confirmação de violência sexual contra esse público devem, obrigatoriamente, serem notificados junto ao Conselho Tutelar, delegacia ou disque 100. Psicólogos de clínicas privadas também fazem parte da rede de proteção e devem cumprir com a lei, na notificação desses casos.

Para compreender como o tema é tratado, a mestre em Psicologia pela Atitus, Linéia Polli, com orientação do professor de graduação e mestrado em Psicologia da Atitus, Jean Von Hohendorffd, desenvolveu a pesquisa “Perfis profissionais, crenças sobre violência sexual e tomada de decisão para notificação: estudo misto com psicólogas da clínica privada”. A investigação teve como objetivo atentar para as práticas e necessidades dessas profissionais.

Contribuíram para com a pesquisa, 409 psicólogos em atendimento em clínicas privadas, sendo 349 do gênero feminino, com idades entre 22 e 72 anos, atuando de 1 a 45 anos em clínicas presentes em 22 estados do país. A coleta de dados foi realizada durante o período de dezembro de 2019 a janeiro de 2021 e se dividiu em duas etapas entre questionários e entrevistas online. Das entrevistadas, 202 já haviam atendido casos de suspeita de violência sexual e outras 160 já haviam confirmado algum tipo de abuso.

O estudo trouxe como resultados decidir por notificar ou não notificar casos de suspeita e/ou confirmação de violência sexual contra crianças e adolescentes dependendo de diferentes fatores.

A decisão pela notificação é maior quando a psicóloga teve informações sobre violência sexual durante a graduação, participou de cursos, palestras e workshops sobre o assunto; a criança tem uma rede de apoio favorável à notificação e ainda, a provável ocorrência de violência sexual já aparece na demanda inicial do tratamento.

A decisão pela notificação é menor quando a suspeita de violência sexual se dá ao longo do tratamento, as psicólogas têm mais tempo de atuação na clínica, desconhecem os procedimentos para notificação ou tem crenças distorcidas sobre violência sexual, como, por exemplo, entender que os abusos são fantasias da criança e/ou acreditar que só se pode falar de abuso quando há violência.

Conforme explica a pesquisadora, "os resultados indicaram que o tempo de experiência laboral não garante conhecimento dos procedimentos de notificação. Com o passar dos anos, na clínica, provavelmente há um afastamento entre a ciência e a profissão. Além disso, psicólogas não qualificadas podem silenciar uma suspeita de violência, não oportunizando o relato da criança”, considera.

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A pesquisa de mestrado trouxe como considerações finais a necessidade de investimento em formação continuada, onde Conselhos Regionais e Federal podem fomentar tais formações, além dos próprios profissionais da área buscarem capacitação.

Também se concluiu a inadequada capacitação para a realização da notificação, a percepção das psicólogas como não capacitados e sozinhos para realização da notificação, o que as leva a delegarem aos responsáveis pela criança a decisão pela notificação; e ainda, uma atuação profissional em discordância com o Estatuto da Criança e do Adolescentes e com o Código de Ética Profissional.

Segundo a pesquisadora, o tema da violência sexual contra crianças e adolescentes e da atuação de profissionais da psicologia nessas situações ainda é um assunto que gera desconforto e resistência. “Desenhar o projeto de pesquisa e executá-lo, juntamente com colegas da área, foi uma experiência única e desafiadora. Pensar na garantia dos direitos de crianças e adolescentes para além do domínio público ainda é uma discussão escassa, mas muito importante”, explica.

“Durante essa experiência pude construir uma visão mais realista do papel da psicologia e da psicóloga na atuação em casos de violência contra crianças e adolescentes. Visão essa que dá margem para as dificuldades e o despreparo que cercam essas profissionais, mas também marca as potencialidades e o que ainda necessita, e pode, ser construído”, concluiu Linéia, ao agradecer a Atitus pelo destaque à pesquisa e à promoção da entidade na discussão de assuntos pertinentes para a sociedade.

Visando contribuir com a prática profissional da área, um minicurso foi ministrado pelos autores do estudo em parceria com o Programa de Atualização do Secad (Artmed). De forma gratuita, o curso aborda os principais aspectos para o manejo clínico da violência contra crianças e adolescentes. Clique aqui para conferir.

A pesquisa contou com o apoio do Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares (PROSUP) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do grupo de pesquisa da Atitus, VIA Redes (Violência, Infância, Adolescência e atuação das Redes de Proteção e de Atendimento).

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